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É difícil ir embora da Ilha do Mel/PR

Durante um certo tempo busquei entender o motivo que faz muitas pessoas visitarem a Ilha do Mel e permanecerem por lá durante anos, ou até mesmo, para sempre. Boa parte destas pessoas vivem em seus vilarejos, alguns são empresários que mudaram radicalmente o estilo de vida e tentaram a sorte neste paraíso, abrindo o seu próprio negócio ou trabalhando na ilha. Já visitei o local duas vezes e confesso, também tive essa vontade. Então, resolvi escrever para passar algumas informações sobre o lugar, além de relembrar as experiências que vivi nessas duas viagens e identificar se existe uma razão para esse fato curioso.


Praia e Gruta das Encantadas

A Ilha do Mel


O lugar é uma área de preservação ambiental que fica a aproximadamente 120 km de Curitiba, no município de Paranaguá/PR. É um local cercado de muitas histórias e cenários de tirar o fôlego, um verdadeiro paraíso. Existem 11 belas praias, distribuídas em 25 km, umas são desertas, outras com pouca urbanização, são elas: Encantadas, Brasília, Limoeiro, do Casual, da Fortaleza, do Farol, Praia Grande, Do Miguel, De Fora, Do Belo, e Ponta do Oeste.


São 2.700 hectares, mas apenas 200 têm permissão de uso e visitação, o restante é uma reserva ecológica que foi tombada pelo Patrimônio Histórico em 1975. Para evitar a degradação, o número de pessoas é limitado em 5.000 por dia. Além disso, não são permitidos veículos automotores ou de tração animal, considerando que não existem ruas nem estradas na ilha. A locomoção é feita por barco, bicicleta, a pé ou por trilhas de terra. Tudo isso dá a impressão de que o lugar parou no tempo, ou será que nós paramos no tempo quando estamos em um local como esse?


A comunidade local vive em pequenos vilarejos, sendo que a maioria da população está concentrada nas vilas de Brasília, Encantadas e Farol. Suas principais atividades econômicas são a pesca e o turismo.


A ilha possui um ambiente rústico e eclético, atendendo diferentes estilos de viajantes, dos mais aventureiros aos mais sossegados, dos mais econômicos aos menos econômicos. Portanto, as hospedagens foram feitas para todos os públicos, algumas são mais simples, outras mais sofisticadas. Existem também muitas áreas de camping.


É um lugar para quem gosta de contato com a natureza, de acampar, surfar, praticar stand up, andar de bicicleta ou apenas relaxar e não pensar em nada.


Vale destacar que, além das praias, existem outros atrativos muito visitados:


- Farol das Conchas: sem dúvidas, o cartão postal da ilha. Atualmente não está aberto para visitação interna, mas o turista pode subir as suas escadas (150 degraus) ou rampas que levam ao topo e apreciar uma vista privilegiada. De um lado a Praia do Farol e do outro a Praia de Fora. O farol foi construído em 1870 por D. Pedro II com a intenção de modernizar a navegação brasileira.


- Gruta de Encantadas: em um grande paredão rochoso a ação do mar formou essa gruta que é cercada de lendas e histórias fantásticas. Uma dessas lendas diz que lindas mulheres (sereias) habitavam este local, elas viviam ali bailando e cantando. Quem ouvisse seu delicioso e perigoso canto perdia o rumo da embarcação e era atraído até a gruta. Por isso, ela foi batizada de Encantadas.


- Capela de São Francisco: pequeno oratório construído ao pé do cruzeiro. Guarda em seu interior várias imagens, sendo a devoção maior, dedicada a São Francisco de Assis, o santo protetor dos animais. Situa-se no Morro Nhá Pina com uma altura de 151 metros acima do nível do mar.


- Fortaleza de Nossa Senhora dos Prazeres ou Fortaleza da Barra: foi construída por ordem do Rei de Portugal Dom José para proteger a Baía de Paranaguá. Era também lugar seguro para o embarque do ouro, madeira e erva mate extraídos da região, protegendo as embarcações dos corsários espanhóis que agiam naquela região. O navio Cruzador Cormorant pertencente a Real Marinha de Guerra Inglesa e marcou a história de Paranaguá em 1850, aprisionando três embarcações nacionais em decorrência do tráfico ilícito de escravos, originando uma batalha histórica. A fortaleza é tombado Patrimônio Histórico e Artístico Nacional desde 1972.


São vários caminhos que levam à Ilha do Mel, além do tradicional pela rodovia, sendo que dois deles merecem destaque: de trem pela Serra do Mar ou de carro pela Estrada da Graciosa. Para saber mais, veja a matéria que aborda estes trajetos: Os diferentes e belos caminhos até Morretes/PR.

A primeira viagem


O ano era 2010. Depois de ouvir falar tanto desse lugar, resolvi viajar sozinho para lá, mas antes, fui conhecer Curitiba e uma parte considerável do litoral paranaense.


Quando pensamos em viajar sozinho bate um certo receio, surgem as dúvidas, achamos que é mais legal e seguro viajar com alguém ou com os amigos, mas nesse período da minha vida, a minha única companhia de viagem era a minha mochila. Já estávamos acostumados a encarar quilômetros de estradas sozinhos. Então, partimos juntos para mais uma viagem. Primeiro, de avião até Curitiba.


Antes de descer a Serra do Mar, me hospedei na casa de uma amiga por três dias, ela me guiou pela fria capital paranaense e mostrou os hábitos e a rotina do povo curitibano. Conheci a cidade utilizando o transporte público que sempre foi considerado uma referência, mas naquela época já estava ficando sobrecarregado. Imagine como deve estar hoje, em 2018. Fui visitar os principais pontos turísticos: a Opera de Arame, o Jardim Botânico, o Parque Tanguá, o Barigui e o Estádio do Atlético Paranaense. Por fim, fui tomar um choconhaque na rua XV de Novembro, centro da cidade.


Toda vez que viajo a um grande centro urbano gosto de observar como é o ritmo de vida das pessoas que moram ali, seus hábitos e suas culturas. Assim, algumas perguntas surgem na minha mente: Como seria se eu morasse por lá? O que mudaria na minha vida se eu resolvesse ficar? Será que os problemas da cidade que eu moro são os mesmos que eu enfrentaria em outra? Quero saber como é acordar cedo, andar de ônibus, mesmo que seja a passeio. Por três dias eu fui um cidadão curitibano e pude ver de perto as suas dificuldades e as suas belezas. O povo curitibano tem fama de ser frio, mas durante a minha estadia, tive outra impressão, fui recebido com muito carinho e calor humano.


Me despedi da capital paranaense e dos amigos às 8:00 da manhã de um dia nublado na Rodoferroviária de Curitiba, e fui em direção ao meu destino. Peguei o Trem da Serra do Mar que desembarca em Morretes. Lá, experimentei o barreado (prato típico do local), depois segui viagem de ônibus até Paranaguá. A partir desse momento, fui desbravar uma série de praias da região.

Durante duas semanas fiquei hospedado na caso de um amigo em Matinhos, e assim, foi possível conhecer as praias não só deste município, mas também de Paranaguá, Pontal do Paraná e Guaratuba. Tinha ouvido relatos que não era interessante visitar estas praias, mas contradizendo o que tinham me falado, fui conferir de perto e descobri que valeu muito a pena incluir estes locais no meu roteiro. Descobri cenários encantadores e tive experiências bem legais. São muitas praias com um cenário bem "roots", ainda pouco visitadas por turistas de outras regiões do Brasil, mas muito frequentadas pelo curitibano, principalmente em feriados prolongados e alta temporada. Por isso, é comum nessas datas ver esses lugares lotados.


Agora sim, Ilha do Mel


Acordei às 05:00 da manhã de um sábado, deixei a minha mochila na casa do meu amigo, peguei minha câmera fotográfica, uma Sony Cyber Shot 7.2, e fui até a rodoviária de Matinhos. Embarquei no ônibus circular para Pontal do Sul e cheguei lá por volta das 06:45. Tomei um café da manhã, comprei meu bilhete no terminal de embarque da Ilha do Mel e embarquei no primeiro barco rumo à Praia de Encantadas. Desembarquei na ilha às 08:30. Ao chegar lá, senti um clima diferente, uma energia boa que na hora não sabia explicar. O dia estava ensolarado, os termômetros marcavam 36 graus, mas a sensação parecia muito maior. Um dia lindo para aproveitar este lugar mágico.


Logo de cara, na Gruta das Encantadas, conheci uma galera de Paranaguá e de Curitiba. Interagi com algumas pessoas e depois fui tirar algumas fotos do lugar. Duas meninas que estavam neste grupo pediram para eu tirar uma foto delas. Elas ficaram impressionadas com o fato de eu viajar sozinho Uma dessas meninas me perguntou:


- Guri, tu é louco de viajar sozinho?

Eu respondi:

- Já estou acostumado.


Trocamos telefones e combinamos de nos encontrar para curtir a noite de Paranaguá. E isso acabou acontecendo posteriormente. Nos tornamos amigos, depois de um simples gesto.


O grupo foi embora, e eu fiquei algumas horas ali na Praia de Encantadas fotografando algumas paisagens e apreciando toda aquela beleza do local. Depois, segui meu caminho, percorri 8 km da ilha, da Praia de Encantadas até a Praia do Farol. Subi em todos os mirantes naturais para apreciar as paisagens do lugar. Em cada praia eu dava um mergulho, sempre sozinho, porém, quando estava próximo ao Morro do Sabão, encontrei outro grupo de pessoas, eles vieram de Sorocaba/SP. Caminhamos até a Praia de Brasília, onde almoçamos no restaurante da pousada Pôr do Sol. Após isso, visitamos o Farol das Conchas e o centrinho do vilarejo antes de nos despedirmos. Então, segui até ao trapiche (terminal de embarque) da Praia de Brasília para esperar o barco e retornar ao continente.


Era 16:50 e o barco saia às 17:00. Foram dez minutos de espera, nessas horas a sua mente vai longe. Eu, que já estava há duas semanas viajando, pude parar e observar, ainda que superficialmente, algumas cenas daquele lugar. Vi uma criança de uns cinco anos pulando do barco no mar e seu pai na rede ouvindo Bob Marley, aparentemente sem nenhum tipo de preocupação, vivendo sua vida simples, longe dos bens matérias, mas próximo daquilo que é o bem mais valioso na vida, a sua família. Foi isso que imaginei.


Comecei a refletir e olhar para dentro de mim. Pensei como levamos nossas vidas nas cidades grandes, na correria do dia-a-dia, no quanto as pessoas são distantes e fechadas, nas crianças presas em suas casas e no medo que nos condiciona a uma vida pacata. Assim, foi inevitável, não queria ir embora. Me questionei sobre o que me prendia e que tipo de vida eu pretendia levar.


Não teve como ficar, retornei à minha vida habitual, mas prometi voltar e conhecer mais a fundo o lugar.


Momento de reflexão


A segunda viagem


Conforme eu tinha prometido a mim mesmo, em 2016 decidi retornar à Ilha do Mel, agora com a minha esposa Bruna. Queria compartilhar com ela aquilo que eu tinha vivido. Estava com uma nova perspectiva sobre essa viagem, e a Ilha do Mel seria o primeiro destino de um mochilão que duraria 25 dias. Tracei o roteiro e, entre os diversos caminhos que levam à ilha, escolhi ir de trem novamente, por questões de custo e logística.


Elaborei um trajeto onde eu pudesse economizar o máximo possível. Dessa vez, fui de ônibus de São Paulo até Curitiba. Depois, fui de trem de Curitiba até Morretes. Em Morretes pegamos um ônibus até Paranaguá. De Paranaguá até Pontal do Sul, outro ônibus. Em Pontal do Sul embarcamos rumo à Ilha do Mel. Ufa! Chegamos em nosso destino. Levamos mais de treze horas para chegar lá e gastamos em torno de R$ 218,00 por pessoa. Tudo saiu como planejamos, não houve nenhuma surpresa desagradável, mas o tempo estava nublado e não dava sinais que iria melhorar.


O deslocamento até lá foi um pouco cansativo, mas eu sempre digo que quanto mais longa a viagem, mais histórias temos para contar. Esta é uma dessas viagens que não pode deixar de ser compartilhada. Valeu a pena todo o tempo na estrada, pois eu estava de volta a este paraíso.


As pousadas ficam distantes dos trapiches, sendo que a Pousada Pôr do Sol, aquela que ficamos hospedamos, fica a uns 15 minutos de caminhada do de Brasília, onde desembarcamos. Ela está situada frente ao mar, tem um estilo rústico e charmoso ao mesmo tempo.


Fizemos um planejamento e um roteiro para esta viagem, mas nesse dia que chegamos nossos planos foram literalmente por água baixo. O sol não quis dar o ar da graça e a chuva impossibilitou muita coisa. Aproveitamos para descansar e curtir a pousada, além de experimentar a deliciosa sopa de capeletti preparada pelo João, dono da pousada e uma grande figura. Tomamos alguns vinhos, e escutei muitas histórias desse homem simples e de personalidade forte. A conversa se estendeu pela madrugada, falamos sobre muita coisa. Esse bate-papo foi um ponto chave para entender quem é o povo que vive lá. Foi nesse momento também que eu descobri a quantidade de pessoas que vão para a Ilha do Mel e acabam ficando por lá para sempre.


No dia seguinte a chuva tinha dado uma trégua. Daí por diante fomos desbravar a Ilha do Mel conforme tínhamos planejado. Alguns momentos a chuva apertava, outros o sol ameaçava aparecer, e assim seguimos. O que mais me chamou a atenção foi a caminhada até a Praia da Fortaleza e a visita a Fortaleza Nossa Senhora dos Prazeres, no Morro do Sopé.


Por conta da instabilidade climática não foi possível conhecer tudo o que pretendíamos, mas conseguimos nos conectar muito bem com o local. O tempo passou e tínhamos que ir embora, seriam mais 22 dias de estrada pela frente. Nosso mochilão continuava. Entretanto, a vontade de ficar mais uma vez passou por mim. Como podemos entender esse fato?


Evidente que o tempo que fiquei no local não foi muito longo, porém com uma certa intensidade. Sem nenhum tipo de exagero, pude perceber algo diferente desde que coloquei os pés nesta ilha, uma atmosfera ou energia que me aproxima de um estilo de vida totalmente diferente. Tudo é mais lento, as ondas do mar é que ditam o ritmo das coisas, a comida tem outro sabor e o stress passa longe. Há também um calor humano muito maior, o que me fez relembrar as amizades que fiz na primeira viagem e a conversa franca com o João.


Para muitos pode ser balela ou apenas coincidência, ainda existem aqueles que podem falar: “esse fato também pode acontecer em outro local”. Sim, pode, não há dúvidas, mas na Ilha do Mel há algo que foge de qualquer teoria. A ilha é um verdadeiro paraíso e existe uma sintonia perfeita no lugar que só quem está lá pode sentir.


Custos da segunda viagem por pessoa:


São Paulo até Curitiba (meio de locomoção: ônibus): R$ 84,00

Curitiba ate Morretes (meio de locomoção: trem): R$ R$ 108,00

Morretes até Paranaguá (meio de locomoção: ônibus): R$ 5,15

Paranaguá até Pontal do Sul (meio de locomoção: ônibus): R$ 5,60

Pontal do Sul até Ilha do Mel (travessia): R$ 15,00

Pousada Por do Sol - hospedagem com café da manhã: R$ 290,00. Duas pessoas em um total de 3 diárias: R$ 870,00/2 = R$ 435. Obs: não relacionei os gastos com a alimentação e bebidas.


Gasto total da viagem por pessoa = R$ 687,00


Onde ficar Para saber todas as opções de hospedagem, acesse aqui.


ALEX FREITAS


Criador, produtor de conteúdo e administrador do portal Mochilão Pé na Estrada. Um viajante nato, amante da fotografia, está sempre em busca do desconhecido e de um contato mais próximo com a cultura de cada lugar.


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